Allocutio Março 2025

Para conhecer Cristo crucificado 

Fr. Paul Churchill
Diretor Espiritual Concilium 
 

“Conhecer Cristo e esse crucificado” (1Cor 2,2). Foi assim que São Paulo expressou isso, pouco mais de 20 anos depois dos eventos da Sexta-feira Santa. Mas nós também, quase 2.000 anos depois, precisamos o conhecer de nenhuma outra forma. Cada vez que celebramos a Missa, cada vez que rezamos diante do Santíssimo Sacramento, cada vez que passamos por uma Igreja, nos lembramos que a pessoa ali presente é aquela que foi crucificada e que ainda carrega em seu corpo as chagas dessa crucifixão. Não há outra forma de recordá-lo ou de estar consciente de sua presença. 

Talvez nós pensemos nele ocasionalmente como o Filho eterno junto do Pai, ou como o Verbo feito carne no seio da Virgem, ou o menino nascido no estábulo em Belém, ou ainda como o grande pregador e realizador de milagres na Galileia. Mas a grande realidade, neste exato momento, é que Ele é aquele que foi crucificado, morreu, foi sepultado e ressuscitou dos mortos, carregando ainda mais as chagas de sua paixão. E seja para um Tomé incrédulo, que exige as feridas em suas mãos, ou para uma Margarida Maria Alacoque, a quem Ele mostra seu coração transpassando, a realidade continua sendo a mesma: Cristo crucificado, ressuscitado, mas ainda com suas chagas. É por isso que temos cinco cravos (ou grãos de incenso) no Círio Pascal.  

São Paulo diz “Nós pregamos um Cristo crucificado” (1Cor 1,23). Toda vez que viemos diante d’Ele para rezar, seja na Igreja ou na intimidade do nosso lar, seja na Missa ou em qualquer outro Sacramento, tenhamos sempre diante de nós aquela realidade: este é aquele que ainda carrega as chagas da Cruz. Essa é a única maneira de conhecê-lo e se relacionar com ele. 

E nunca nos esqueçamos de que a razão pela qual ele é assim é por causa de nossos pecados. Ele ainda carrega as feridas de nossos pecados. Mesmo na eternidade adoraremos o Cordeiro em cujo sangue todos fomos lavados (Apc 7:13-14). De fato, no Livro do Apocalipse, há 28 referências ao cordeiro, e muitas delas se referem a ele como imolado (morto) ou ao seu sangue, pelo qual somos lavados e purificados. Está é sua realidade atual e como ele será na eternidade.  

 Quando você vem para rezar a Ele, quando você pede ajuda Dele, como você visualiza ele? Lembre-se das feridas dele toda vez. Lembre-se que é por causa de seus pecados ele sofreu tudo isso. Este deve ser o ponto de partida de cada encontro com Ele. 

 Quando Jesus aceitou a moldura de madeira da Cruz, ele aceitou algo ainda mais pesado. Ele levou os pecados do mundo inteiro. Como foi dito por meio de Isaías: “Ele foi ferido por causa da nossa transgressão, e moído por causa dos nossos pecados” (Is 53,5). 

A decisão e a intenção de crucificar Jesus haviam embutido nela todos os pecados do mundo. Ódio e ciúme por parte dos saduceus e fariseus, a traição da verdade por Pilatos, a opção de Pilatos e dos apóstolos de ir para se salvar e optar pelo conforto pessoal. E então talvez a maioria silenciosa. Podemos ler naquele momento também o abandono absoluto da compaixão. A oração e a reflexão mostrarão mais. Este é o peso que Ele carrega; este é o fardo que ele sabe que deve carregar para que o reino do pecado possa terminar. 

 Mas então ele cai no chão. Sua força física o deixou. Mas talvez também esteja sob tensão. No entanto, ele sabe que deve se levantar e continuar até o fim. E quando ele se levanta, ela está lá, aquela a quem ele se dirige como “Mulher!” Aquela pessoa na citação de quem ele mais depende. Ele sempre dependeu dela. Agora mais do que nunca. Porque ele vê nela, não apenas sua mãe, mas aquela cheia de graça, beleza, amabilidade, compaixão e o mais puro amor. Ela mostra a ele que a raça humana é linda e vale a pena lutar. Dela ele obtém forças para seguir em frente e completar sua missão.  

 Ele tem isso reforçado por Simão, que de bom grado empresta seus ombros à cruz, apesar de ser forçado a isso. Verônica mostra a ele uma bondade espontânea e, de fato, à medida que sua provação continua, ele se vê recompensado. O jovem João está lá com sua mãe, Madalena e as outras mulheres, o bom ladrão o defende e pede sua intercessão. E ele, assim que morreu, ouviu o centurião dizer: “Este era um homem bom, este era um filho de Deus?”.  

 Na morte, ele retorna ao Pai na eternidade e carrega sua paixão e morte suportadas até seu Pai Celestial. E ela se eterniza para que em cada Missa possamos ter contato direto com ela. Mas, como mostram suas experiências de ressurreição, ele ainda carrega suas feridas. É assim que devemos olhar para o Senhor no altar, no Tabernáculo, nos nossos espaços privados, cada vez que nos dirigimos a Ele. Ele é o Senhor que carrega as feridas dos nossos pecados, pelos quais se entregou totalmente.  

 Em sua existência terrena, ele dependia de uma pessoa acima de todas. Dele dependia o Sim de sua entrada em nosso mundo, de seus seios dependia de seu primeiro leite, de suas mãos gentis dependia para dar seus primeiros passos, de sua orientação ele mantinha fora dos olhos públicos antes que ela o liberasse para prosseguir com seu ministério nas bodas de Caná, símbolo das bodas do Cordeiro que foi morto por nós.  

São Paulo disse “Com os meus sofrimentos, compenso o que falta ao sofrimento de Cristo” (Cor 1,24). Nossa Senhora viveu isso. Ela nos pede para fazer o mesmo. E eu me pergunto o seguinte: Nosso Senhor algum dia será limpo dessa ferida da Cruz? Talvez, mesmo assim somente quando o último dos redimidos chegar ao céu. Mas talvez seja nossa alegria vê-lo para sempre carregando aquelas feridas que nos mostram a profundidade de seu amor e a maravilha de seu sofrimento. Pelas suas chagas somos curados. 

 “Nós te adoramos, ó Cristo, e te bendizemos, porque por tua Santa Cruz remiste o mundo.” 

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